sexta-feira, 31 de agosto de 2012

De repente...

- Clarinha...
- Humberto! Quanto tempo, hein?
- É, você falou que iria me ligar no outro dia e até hoje nada...
- Pois é, não deu...
- Que aconteceu? Perdeu meu número?
- Não, não... eu até pensei em ligar, mas...
- Ah, entendo... não gostou da transa, né?
- Não, gostei demais...
- Então porque não ligou? Não queria mais?
- Clarinha, querer eu queria, mas...
- ... pensou que eu iria pegar no seu pé, né?
- Bem, eu não estou muito a fim de relacionamento sério, entende?
- Nem eu!
- É mesmo?
- É! Prefiro pegar um cara aqui, outro numa balada acolá...
- Ah, pensei que você fosse do tipo careta...
- Eu? Careta? Que nada... agora mesmo acabei de transar com o Carlos...
- Carlos? Da faculdade?
- Isso, o da barba...'
- Mas ele não é gay?
- Ah, mas com certos estímulos, ele até deu pro gasto...
- Nossa! 
- E você, Humberto, que tá aprontando?
- Ah, ando aí trabalhando com marketing...
- Hum... com o Teodoro?
- Com ele mesmo!
- Me passa o número dele, eu perdi...
- Não me diga que você e ele já...
- Uma das melhores fodas que já tive...
- Poxa, Clarinha... com quem que conheço que você ainda não transou?
- Com seu irmão...
- O Gustavo, você tá de olho no Gustavo?
- Ah, se ele estiver disponível, de repente...
- Porra, e pensar que eu cheguei a pensar que você queria ter um relacionamento sério comigo...
- Quem quer muito ter um relacionamento sério com você é o Carlos!
- O da barba?
- Ele mesmo... te acha um gato!
- Olha... quem sabe, de repente...

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Eu sei


Foram dias,
Noites acesas,
Calor,
Mas tudo passa,
Sempre,
Passa...
Eu sei,

Deserto em luz,
Solidão aflita,
Desejos incandescentes,
Inexatidão exata,
Tropeços em plano,
Planos sem metas,
Metas...

Foram noites,
Dias escuros,
Frio,
Mas tudo passa,
Sempre,
Passa...
Eu sei,

No meu peito,
Apenas o desejo,
De algo,
Que como você,
Procurava,
Em dias,
Noites...

Eu sei,
Eu sei,
Eu sei.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Lençóis de cetim


É…

Fique calma, não se aflija, pois serão apenas, e poucas, palavras. Coisa de nada. Pouca coisa de um tudo. Tudo isso que um dia nos passou pela cabeça. Roupas jogadas, beijos beijados, falo no teu falar, gozos, gostos, lençóis. Cetim negro espalhado pelo quarto. Luz à meia luz. Intensos espasmos em curtos períodos. Há marcas. Estas marcaram-me a alma. Essa que hoje, você aí, desdenha e canta canções que ainda não terminei. Em frangalhos fico aqui. Esta selva aproveita os meus recortes e me consome. Pedra, selva, mundo, imundice, quarto. Passeio pelos quartos, esses mesmos onde já dormi com você. E hoje, neste dia sombrio, ainda passeio com a esperança de lhe encontrar nua espalhada sobre os lençóis negros de cetim, pelo qual escorregávamos, e onde nos encontrávamos. E mesmo triste, com o pau em riste, você também verá uma triste beleza. Pois é claro, minha cara, existe sim, existe sim uma beleza em toda essa tristeza.

Aqueço o peito com o café amargo, como uma fatia de queijo, ascendo um incenso, caminho até o quarto e espero as horas passarem. Deito em lençóis negros de cetim...

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

A sistemática das coisas imperfeitas

- Isso acontece...
- Eu sei...

Acendeu o cigarro, mesmo jurando, há mais de dez anos atrás, nunca mais voltar ao vício. Do lado, a mulher mais bela de toda a cidade, nua, cabelos soltos permeando o ambiente com seu perfume inconfundível.

- Vamos de novo?
- Espera só um pouco, tá?

Levantou, andou de pés descalços no frio piso da pousada, dirigiu-se ao banheiro. Deixou o Malboro queimar em cima da pia e se olhou no espelho, relembrando suas últimas horas: a chegada, a pergunta sobre onde iria se hospedar, o banho, a roupa para aguentar o frio, o bar onde se sentou, os olhares que trocaram, o beijo e o convite para o sexo. Jogou água no rosto, olhou novamente sua imagem no espelho, vislumbrou uma parte do seu corpo nu.

- Tá aí?
- Sim...
- Vem, tá frio aí...

Chegou rente à cama, apreciou novamente o corpo dela e delicadamente acariciou seus pés, pernas e conseguiu um suspiro. Com outra mão, acariciou os seios, o pescoço e arrancou, desta vez, uma súplica... 

- Vem, vem, vamos tentar de novo...
- Acho que não consigo...
- Quer que eu chupe?

Ah, a famigerada impotência sexual...

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Doce da vida...


Mas é amargo. É sempre assim? E a vida, parece com ele? Na verdade se adoçarmos aos poucos fica bom. A vida também. Temos nossos torrões de açúcar que ajudam a adoçá-la. Mas nem sempre os torrões disponíveis são suficientes. E aqui, temos os torrões necessários para xícara? Café desperta. E a vida, o que a desperta? Você desperta a minha vida. Você e ele. Cada qual com seu jeito. Sempre a despertam. E eternamente a adoçaram também.  Assim como a fé é o sal da vida, filhos são o que fazer a vida ficar mais doce. E vocês, cada qual da sua maneira, adoçam a minha.

Fecha a caderneta, levanta da cadeira, olha pela janela, puxa a cordinha do sinal, o ônibus para, ele desce e sobe a Bahia em direção a Augusto... Manhãs gris de agosto.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Sexo a 3


Esperava impaciente a sua vez. O terceiro colocado no jogo de azar feito lá em baixo, num bar mal falado onde todos são suspeitos, esperava na porta, inquieto, a hora em que a mulher dama o chamaria para consumar sua dívida de sexo.

Pagaram antes, os três. Três notas para cá, três promessa pra lá. Entrou o primeiro e ouviu-se gritos falsos da puta, gemidos de prazer contestáveis e o ranger da cama de mola velho. Fechou os olhos e imaginou o lugar: luz vermelha, um rolo de papel higiênico para a primeira e última limpeza dos órgãos sexuais, candelabro em cima de um criado mudo, tapete velho nos dois lados da cama, uma velha pia pingando água insistentemente e o cheiro característico de sexo permeando o ambiente promíscuo. Entrou o segundo pouco tempo depois e os mesmos gemidos, os mesmos gritos que soam falsos à ouvidos atentos e o mesmo ranger de molas. Saíram os dois, ajeitando as roupas, e o terceiro entrou. A dama ordenou que tirasse a roupa e o frangote assim o fez, ainda trêmulo. Com suas unhas vermelhas, terminou de puxar a peça que encobria as vergonhas e pôs-se a chupar a rola adormecida do rapaz. Ele observava o ambiente: pedaços de papel lambrecados de sêmen espalhados ao lado da cama, a roupa barata de quenga no cabide e porra seca grudada no cabelo longo da prostituta.

Afastou-a rispidamente. Dela ouviu desaforos, ouviu a verdade que era virgem, ouviu risos dos amigos que lhe esperavam do outro lado da porta, ouviu o desabafo do seu peito. A respiração tornou-se menos ofegante assim que desceu as escadas e ganhou a rua, desta vez sozinho.

Havia se tornado um homem.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

O suicídio de Helena

Não estava em seu estado normal. Estava transtornada. Não aguentava mais o apartamento, não aguentava mais a vista da janela, não aguentava o brilho etéreo de suas lâmpadas e abajures. E principalmente, não aguentava mais olhar no espelho e ver aquele rosto pálido e frágil lhe encarando de volta. Não aguentava mais aquele vazio.

Todos tinham partido. Helena ficara sozinha consigo mesma. E seus pensamentos eram negativos demais, obscuros demais, exaustivos até. E não conseguia parar de pensar, mesmo esvaziando a mente, a paz durava alguns segundos e logo todo o negrume invadia sua mente e a tomava por inteiro, tornando sua angústia ainda pior.

Não sabia mais o que fazer. Precisava retomar as rédeas de sua própria vida. Era hora de mudar radicalmente. Esquecer a Helena inocente, a Helena sofredora, a Helena dominadora, a Helena submissa, a Helena cheia de segredos. Decidiu recomeçar, se purificar. Começaria pelo armário.
Jogou todas as roupas pretas em cima da cama de casa, com roupa de cama também negra, e começou a escolher e separar em duas pilhas. A maior, roupas que seriam doadas, vendidas ou até jogadas fora, não poderiam mais ficar, estavam carregadas de lembranças, pensamentos, coisas que não faziam mais bem. Já a menor, com umas poucas peças recatadas, com desenhos alegres, ficariam, mas bem no fundo do armário, Helena evitaria o preto daqui pra frente.

Tirou a própria roupa do corpo, enrolou-se numa toalha cor de rosa, simples, mas alegre. Sentou-se à janela e notou que sobraram poucas peças de roupa no armário, praticamente tudo que tinha era preto, até a decoração de seu quarto era preta. Helena precisava de um novo ambiente, precisava de luz.

Enfiou-se no chuveiro, lavou-se até sentir que todos os pensamentos tristes deixaram seu corpo. Vestiu a única peça de roupa alegre que tinha no armário, um vestido vermelho, curto e solto ao redor do corpo, estampado com borboletas brancas. Calçou o único par de sandálias que possuía, uma de salto baixo, também vermelha com branco, ganhara-as junto com o vestido, na última tentativa de sua mãe de fazê-la “mudar de estilo”, como ela dizia.

Saiu para a rua, foi passear e admirar pela primeira vez em seis anos os arredores do lugar que morava. Parecia que era a primeira vez que abria os olhos, os ouvidos, todos os seus sentidos pareciam estar despertando nesse momento. Ouvia os pássaros, o vento, as crianças correndo e brincando e seus pais a lhes cuidar. Via o céu, o sol, as árvores, as pessoas. Sentia o cheiro de grama recém cortada. Sentia o gosto da pipoca doce que comprara. Sentia a textura do banco de madeira onde estava sentada admirando o mundo.

Helena finalmente se sentia completa. A luz, o calor e as risadas a preenchiam, deixavam-na embriagada, faziam-na sorrir. Ela sentira falta desse sorriso espontâneo, natural, inesperado, um sorriso que há muito não aparecia no rosto de Helena. Nem mesmo o suposto amor que sentira tinha feito ela se sentir tão bem.

Agora Helena abandonava essa metade sombria que lhe assolava a alma.

Enfim assumia ser quem realmente era.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Vem sambar, Matilde


Foi no seu balanço e mais dois whiskys que decidi parar. Andei tantos e tantos anos. E neste seu swing eu resolvi parar. Você me mexe. A mecha ruiva lilás de seus cabelos loiros também me mexe. Seu corpo cor de fogo me mexe. Definitivamente você, morena, me mexe.  O copo está transbordando, o gelo derrete, o seu fogo, o meu fogo, dormência num único copo, samba-rock na vitrola, um black no cristal, você, minha black, a dançar sala adentro. Tranco a porta, não te quero lá fora. O mundo... o mundo que se exploda, pois você, minha belezura, é minha, só minha, dance... dance... troco, claro que troco, sempre troco suas sandálias de prata quantas vezes forem necessárias. Vem...
Rebolo desconjuntado ao seu lado. Qualquer um fica no desengonço total ao seu lado. Olhe seus passos, me passe um pouco do teu mel. Me lambuze em teu corpo nu. A dois por dois suplica sua presença. Fecho a luz, apago as cortinas, danço no seu rebolar. Rebolo em você. O doce do carvalho no teu corpo, você é meu copo. Embebedo-me em teus poros. Desejo você como nunca, como sempre, como tudo. Você e seu swing. Desengonço mais uma vez e caio nas graças dos meios de suas coxas. Embriago-me em teus caldos. Suma com esse importado, o que me interessa é o teu produto nacional. Viro Hugo e nacionalizo você. Você é a musa. Minha musa. Quente e doce os meios de suas coxas. Dance...
Ébrio, no teu corpo, adormeço.  Mesmo em sonhos rebolo com seu rebolar. Caminhos que caminhei. Desejos que desejei. E agora, depois destes dois whiskys e seu balanço, resolvo parar. Pulo em puro júbilo, demente é quem não ama, nem que seja por uma noite, por uma mulher, por uma calcinha dependurada no box do banheiro pela manhã. Eu te amo minha musa nacionalizada na República Federativa do Santa Tereza. Até essa, minha linda e única deusa, está encantada com seu rebolar, e é por isso que Tereza continua a cantar, com suas sandálias de pratas. Durma...
A bolacha para de tocar, o whisky barato no copo, a cabeça a girar e Jorge Ben profetizando: Vem morena vem, Vem morena vem sambar, vem morena vem, que o samba está a lhe esperar... enquanto isto, fico com estes dois whiskys...

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

O problema é o amor


Bashar al-Assad ama o poder, assim como os insurgentes amam a liberdade.
Muita gente ama amar sem camisinha, mas ninguém ama uma pessoa só.
Tem gente que ama e faz bobagem; outras fazem bobagem por amor.
O amor em foco, o amor em evidência, o amor como centro de tudo e de todos.


Tem gente que ama heróis em quadrinhos - e isso não é problema nenhum, mas existem psicopatas que adoram matar inocentes em cinemas.
Muitos políticos amam desviar dinheiro público, assim como muitos cidadãos amam desperdiçar o seu voto.
O ditador sírio, o Saddam e o Slobodan, todos eles que provavelmente não vão para o céu, será que amaram trucidar o povo em prol do amor seu ao poder?

O amor é o problema! 
Ou seria o problema a falta de amor?